Prometeu ainda está lá na rocha sendo açoitado pelos abutres. Eles lhe comem o fígado todos os dias. E seu sacrifício lhe soa inútil há séculos. Em seus ouvidos, sopram ventos de incerteza, de melancolia e até de tédio. Quem diria. Tanto sacrifício para que a raça humana se tornasse humana e agora seu ritual lhe parece vazio. Prometeu já não ousa. Envelheceu. O mito apenas se conforma à ausência de Destino. Porque até os deuses parecem ter se retirado do Olimpo. O silêncio lhe penetra as entranhas e não vê a natureza se transformando como d’antes. Como se nem ventasse. E nem fizesse frio. Antes tinha um segredo ansiado pelo próprio Zeus, mas onde ele está? Por isso, de rosto erguido, continua sua batalha sem palavras. Ainda que ela tenha perdido seu sentido no tempo. Sacrifício já até apagado e fora da história dos homens mortais e esquecidos. Agora chove. E tal lhe parece um signo de vida, um murmúrio, um dos últimos, da sombra, da lembrança que era a terra. Trovoadas e gritos se misturam e eles vêm daquela triste sombra. Naquele lugar, fora de qualquer vista conhecida, a Grande-Mãe oferece-lhe seus seios e deles caem gotas que alimentam a eterna testemunha do holocausto. E não tão longe assim do deus, entre o fogo roubado aos homens, só há manchas de sangue.
Mas tudo passa sobre a terra.